Lula intervém, freia rebelião e manda PT injetar dinheiro na campanha de Boulos

Ala do partido queria barrar repasse do fundo eleitoral a aliado para priorizar candidaturas de vereadores

O presidente Lula foi acionado por integrantes do PT para arbitrar um conflito entre alas do partido contrárias e favoráveis ao repasse de recursos do fundo eleitoral para a candidatura de Guilherme Boulos (PSOL) à Prefeitura de São Paulo. Lula determinou que a legenda ajude financeiramente a chapa, que tem na vice a petista Marta Suplicy.

A movimentação contrária à ajuda partiu de pré-candidatos a vereador na capital paulista, que reivindicavam uma compensação pelo fato de o PT ter aberto mão de candidatura própria para apoiar Boulos. Todos os atuais nove vereadores tentarão a reeleição em outubro.

Integrantes da cúpula do PT chegaram a desaconselhar a contribuição direta para a campanha do PSOL, sob o argumento de que essa não é uma prática regular do partido e que, inclusive, poderia embaralhar a prestação de contas junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Já defensores do suporte financeiro lembram a importância da eleição de Boulos para a base de apoio de Lula. Com o envolvimento direto do presidente, a campanha em São Paulo é tratada como fundamental para a esquerda no enfrentamento ao campo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com vistas a 2026.

O valor exato do fundo eleitoral a que cada partido terá direito ainda não foi divulgado pelo TSE, mas o cálculo é que o PT receberá R$ 604 milhões, a segunda maior quantia entre todas as legendas, atrás apenas do PL. O PSOL deverá ser contemplado com R$ 127,8 milhões. No total, o fundo neste ano será de R$ 4,96 bilhões.

Na semana passada, em uma reunião da bancada paulistana com o presidente municipal do PT, Laércio Ribeiro, ficou definido que o pedido para a direção nacional será de R$ 15 milhões para as campanhas de vereadores. A chance de a cifra atingir tal volume, no entanto, é considerada remota.

O recurso para a candidatura de Boulos e Marta não entrou na pauta do encontro, segundo relatos, sob a justificativa de que o montante será fixado pela nacional.

O debate sobre a divisão de recursos se intensificou nos últimos meses e continua sendo travado em reuniões fechadas do partido, tanto na capital paulista quanto em Brasília.

Numa das conversas, chegou a ser debatida a possibilidade de o PT deixar de contribuir com o PSOL nos custos da campanha majoritária, mas a discussão acabou sendo abandonada. Uma das ideias era vetar contribuições a partidos de fora da federação PT-PC do B-PV, o que não prosperou.

Informado sobre resistência dentro de seu partido, Lula conversou diretamente com a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), e com a tesoureira, Gleide Andrade, em busca de uma solução. Consultadas sobre o caso de Boulos, informaram não haver possibilidade de aporte direto ao candidato do PSOL.

A saída em estudo é a destinação de recursos para a candidatura da vice, valendo-se da cota reservada às mulheres. A legislação obriga os partidos a aplicarem ao menos 30% do fundo eleitoral em candidaturas femininas. O medo, contudo, é que outros aliados passem a cobrar o mesmo tipo de colaboração.

Para as próximas eleições, a expectativa é que o PT aprove uma resolução proibindo a destinação de recursos diretamente a partidos aliados, mas permitindo, excepcionalmente, contribuição para vices do PT.

No caso paulistano, os recursos do partido poderão chegar à chapa via Marta. A ex-prefeita deverá ter direito a uma parcela da cota prevista para mulheres brancas, segundo os critérios do TSE. A lei permite que candidatos a vice abram uma conta própria de campanha, registrando receitas e despesas.

O repasse de recursos a outros partidos inspira preocupação por causa de experiências malsucedidas no passado. O PT já foi obrigado a assumir a responsabilidade financeira por causa de partido aliado que teve problemas após a campanha e tinha sido beneficiado com verbas petistas do fundo eleitoral.

Dirigentes de PT e PSOL têm evitado dar informações sobre as tratativas, limitando-se a dizer que os critérios para a distribuição ainda estão sendo definidos. As duas siglas afirmam, no entanto, que a prioridade para a eleição na capital paulista será refletida na destinação de recursos.

Membros das duas legendas envolvidos nas conversas sobre os aportes financeiros negam haver mal-estar e dizem que as cúpulas estão alinhadas sobre a necessidade de investimentos.

A bancada petista reivindica um total superior ao que foi destinado na eleição de 2020, argumentando que, além de não contar com o impulso na campanha de uma candidatura do PT a prefeito —naquele ano, o candidato era Jilmar Tatto—, o valor que o partido receberá neste ano será maior e os repasses devem ser proporcionais.

Há quatro anos, foram enviados R$ 4,5 milhões para o conjunto dos candidatos a vereador e
R$ 5,6 milhões para a campanha de Tatto. Uma ala defende que, desta vez, as campanhas à Câmara Municipal tenham direito ao menos à soma desses valores (R$ 10 milhões).

Em 2020, quando também concorreu à prefeitura e chegou ao segundo turno, Boulos teve uma campanha com recursos modestos para os padrões paulistanos. Ele levantou, no total, R$ 7,5 milhões, sendo R$ 3,9 milhões enviados pela direção estadual do PSOL e o restante oriundo de uma vaquinha virtual que arrecadou R$ 2,8 milhões e de doações individuais.

O risco para as candidaturas do PT a vereador foi um dos pontos citados na resistência à aliança com Boulos, costurada por Lula ainda em 2022. O argumento era o de que a bancada petista seria prejudicada pela ausência de um candidato petista a prefeito, algo inédito na cidade desde a redemocratização.

Como prevaleceu o acordo proposto a Boulos, o discurso passou a ser o de que a chapa precisa ter “condições de disputa” e, para isso, deve estar bem posicionada no quesito orçamentário para fazer frente aos aliados do atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), apoiado por Bolsonaro.

Apesar das pressões, dirigentes têm acalmado os ânimos dos pré-candidatos lembrando que a campanha em São Paulo é prioritária para o PT e que não faltarão verbas. O partido definirá os valores em agosto.

A meta para a Câmara Municipal de SP é aumentar o atual número de cadeiras da sigla, mas um entendimento mais realista é o de que é preciso, ao menos, manter as atuais. A federação deve lançar 49 candidatos pelo PT, 5 pelo PV e 2 pelo PC do B.

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